domingo, 11 de novembro de 2007

A Supremacia dos Serviços Públicos

Estava eu a caminho de uma repartição de finanças vai para 6 anos, quando a pessoa que ia comigo ao lado me disse "É espantoso, és das pessoas mais calmas que conheço, até pores o pé numa repartição pública. Crescem-te invisible wolverine claws e tenho praticamente a certeza que tens uma outra personalidade que faz override". Na altura não achei aquilo muito simpatico, mas depois de ter ouvido o meu progenitor dizer algo semelhante, não me ri tanto e dei o benefício da dúvida. Hoje tenho a certeza que qualquer pessoa fica com as mesmas garras activadas automáticamente quando está a tentar resolver um problema numa repartição pública. Quando se dá por ela, já nos transformámos em Wolverine.

Felizmente uma pessoa amadurece e tão logicamente, como a "Logical song", há situações em que é quase impossível não ser cínico. Confesso ( com alguma vergonha é um facto) que o cinismo por vezes tem a sua beleza perante a obtusidade. Porque as claws ainda cá estão, mas em vez de sairem apressadamente, fazendo notar o seu som metálico e incisivo, aprenderam a sair devagarinho e por vezes (também o confesso com algum embaraço...) maquiavélicamente. Pior que isso, apanhei-me a semana passada a ser feliz, porque finalmente vi uma Conservatória a cometer uma ilegalidade. Estive vai não vai para mandar o caso, para algum canal televisivo mais mediático, mas dada a boa vontade da Conservatória em resolver a questão, contive-me. Com pena, mas contive-me. O que obviamente não me impede de relatar o caso aqui, no intuito de alertar cidadãos não informados.

Pois a semana passada dirigi-me à Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa, para pedir uma certidão de nascimento, com urgência, porque precisava de a entregar no próprio dia, até às 15h00, não interessa onde, nem porquê. Pedi gentilmente, após ter comprovado com documentos e tudo a gravidade da minha situação e porque carga d'água precisava eu tanto da certidão até àquela hora. Deram-me a resposta nº 357/TF (eu tenho a tradução deste TF mas obviamente sou bem educada) "compreendemos, mas não vai ser mesmo possível porque temos à sua frente 400 fotocópias para tirar". Como não sou de me dar por vencida à primeira (not at second or third for that matter) insisti e perguntei o que poderia eu fazer para ter a dita certidão até às 3 da tarde. Ao que a senhora, gentilmente me respondeu "bem, visto que tem que entregar a certidão em Almada, eu posso mandar uma cópia para Almada por fax, e é autenticada lá, mas paga aqui com a taxa de urgência. Assim é só autenticarem lá com o selo branco."

Posso estar errada, mas perguntei inocentemente à gentil senhora "Desculpe, mas se o problema é tirarem a fotocópia, e visto que a vão tirar para enviar para Almada, não seria mais lógico, autenticarem logo aqui com o selo branco e eu ficava despachada?" Era lógico para mim, mas por alguma razão que me é perfeitamente alheia, não era lógico para a senhora que preferiu ter o trabalho de tirar a cópia e enviar por fax para Almada e ainda dar-me uma cópia do relatório de envio para eu apresentar na Conservatória de Almada. Paguei e fui a correr para Almada.

Expliquei o sucedido, com o ok do relatório de envio de fax e respectivo recibo de pagamento na mão. Fiquei então a saber que, para poderem por o selo branco eu tinha que pagar outra vez 16,50€ e que tinha pago ilegalmente o valor da taxa de urgência, pois desde dia 28 de Setembro de 2007 as Conservatórias deixaram de poder cobrar taxa de urgência. Pronto, entre o rap da funcionária da Conservatória de Almada com a do Registos Centrais que certamente foram enganadas, o que tinham tomado de manhã não era galão, era Red Bull versão "café au lait" e como a hora avançava e já eram 14h30, achei por bem pagar outra vez e ir entregar a certidão.

Por resolver ficava a devolução dos 20 e poucos euros que eu tinha pago na primeira Conservatória. Foi então que me apareceu na cara um largo sorriso. Tinha em meu poder um documento que comprometia a Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa. Duplamente. Não só me tinham cobrado ilegalmente uma taxa de urgência, como se tinham feito pagar por um carimbo que não tinham posto. Foi uma tentação difícil de resistir, mas no dia a seguir tinha um envelope à minha espera, em Lisboa, com 20 e poucos euros devolvidos. Enfim...ainda assim emoldurei mafiosamente o recibo, e maravilhei-me com o poder daquele pedacinho de papel se acidentalmente caísse nas mãos da SIC ou da TVI.